domingo, fevereiro 10, 2008

Imprevisibilidade da Fantasia


Imagem daqui

sexta-feira, novembro 23, 2007

post-it # 9

a bunch of...

foto de AmorFati




a lover? a lover is someone who tells you the truth, but not the whole truth and nothing but the truth.

terça-feira, novembro 06, 2007

post-it # 8

foto de katia chausheva



à noite, venho olhar-te no rumor das palavras soltas pelos cantos da casa. então, antecipo a tua ausência, pego nos gestos esquecidos da memória e apago todos os sons. até à clara certeza de algo ter morrido.

quinta-feira, outubro 11, 2007

post-it # 7

…esta janela por onde me entra o céu. devolve-me as estrelas. é que sem elas o meu corpo já não consegue marinhar.



foto de katia chausheva

segunda-feira, maio 21, 2007

Sei lá o quê…ou o afagar de memórias...


Perdida no meio dos muros, que eu própria ergui, vivo a fantasia de ser aquilo que não sou capaz de ser. Pelo sonho e ilusão, encontro um equilíbrio pardo, amarelado, que me suaviza a dor da minha própria ausência.
Na fantasia, sinto as tuas mãos, tão diferentes das que conhecem a geografia do meu corpo.
No sonho, uns lábios de sabor a mel, tão diferentes do sabor da rotina dos que conheço.
Na ilusão, o cheiro do teu corpo a maresia, tão diferente do que já se confunde com o meu.
Pouco interessa quem és, se me permites a ilusão de me sentir renascer.
Mas, quando os meus olhos se abrem, apenas sinto a tua ausência em mim, a dor do desejo, a permanente insatisfação que me tolda a mente, que me acentua a dor, quase física, de te não ter.
Amor? Romance? Liberdade? Auto estima? Sei lá o quê…
À mercê de todos os outros, sempre os outros, no meu pensamento, ergo bem alta a herança do preconceito de ser leal a mim própria, aos meus desejos e sentimentos.
Pelo bem dos outros, não hesito em actos de autofagia do que quero, do que me faria sentir mais mulher, mais pessoa, mais eu.
Tenho, em agonia, uma máscara de sorrisos pregada no rosto que, em oferenda, fazem os outros um pouco mais felizes.
Ainda pelos outros, pela lealdade aos outros, pela regra do estipulado como virtude, sou a tecedeira parcimoniosa do mais ignóbil crime – deixar que a Vida, apenas desenhe rugas no meu corpo e amargue o meu olhar!
Poderão os outros ser bafejados com momentos de maior felicidade, originados pela insatisfação a que me voto? Ou será ilusão? Valerá a pena?
Olho-me ao espelho…é difícil ver-me por detrás da máscara.

Receio perder-me de vez…

domingo, março 18, 2007

o seu poema


Luís Miguel



....o amor, a dor, os passos, a amizade, o amor.....


Esse ano vivi o inimaginável...uma dor profunda me partiu ao meio...me vi tão perdida..me senti tão só que por um momento cheguei a esquecer como eram as pessoas. Fui aonde não imaginaria que existisse...fui ao mais fundo de mim e encontrei um vazio...porque a dor arrancou-me tudo. Perdi o caminho de volta e não restava mais nada. Mas viver é surpreender-se e o impossível aconteceu...sou testemunha. Achei o caminho de volta...palavras ...palavras que vinham de tão distante , como eu estava, vieram me socorrer...e do
nada o encontrei. Passo a passo, lentamente fui recuperando os pedaços de mim:

pedaços de minhas certezas, pedaços de meu querer, pedaços de meu pensar, pedaços de meu sentir, e os pedaços de minha alegria...

Até hoje ainda estou retornando. Há dias em que sinto uns passos dado atrás , mas tenho um dia seguinte onde os recupero e avanço. Não perdi qualquer coisa, perdi o único amor concreto e certo que tive e senti. O bsoluto, o todo, o completo, o que foi /é o maior , o melhor, o que me colocou de pé e me fez acreditar em viver. Esse amor perdi ...no dia a dia, no tocar...no ouvir...no ver...o perdi ...

Perdi meu pai.

Não voltei a mesma, muita coisa ficou lá naquele vazio...talvez até para que eu me iluda com a idéia que não há mais vazio dentro de mim. Não importa. Lá ficaram. Foi necessário. Não conseguiria trazer tudo. Não poderia, como não sou, ser a mesma pessoa.

Recuperei a minha consciência e recuperei a força para suportar a dor. Isso foi o primeiro passo.


Recuperei a clareza de idéias e compreendi o que era uma dor. Esse foi o segundo passo.

Recuperei a visão do dia, das coisas, seu peso, seu sabor, suas consistências, os cheiros. Esse foi o terceiro passo.

Recuperei as diferenças, noite - dia, claro e escuro, dentro e fora, sim e não, o ambiente, o espaço, meu sentir, meu ver, meu querer Esse foi o quarto passo.

E recuperei a alegria quando por fim distinguir saudade de tristeza. Percebi que ainda tenho amor dentro de mim e recomecei a amar. Esse foi o último passo.

Uma estranha luz atravessou -me a vida...Nela encontrei uma sensação que só hoje sei como possa nomea-la: amizade. Porque essa luz/amizade reeducou o meu viver, reeducou o meu pensar, reeducou o meu ver. Para preservá-la , acordo todos os dias lutando comigo mesma para ser uma pessoa livre, simples, serena.

Muitas palavras foram e ainda são necessárias, uma verdadeira construção ou uma reconstrução de mim. Mas fiz as pazes com a vida, fiz as pazes com minha força interior.

E assim amando a minha luz vou recuperando-me da dor do amor que perdi. Ainda são passos , mas são passos mais leves, mais seguros.


Texto da Della-Porther que aqui trouxe por nele me sentir tão identificada...


2007: prevaleça o amor, a amizade.

***


sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

São Salvador - Bahia

terça-feira, fevereiro 13, 2007

Sonho de uma Noite de Inverno...

Não há histórias de amor, sem dramas ocultos, dizia-me na sua voz doce minha Avó…

Imagem de Claude Théberge


Acordei sobressaltada, num cenário surreal, com o estrondo atrás de mim… personagens saídas de uma peça de Shakespeare, volteavam em meu redor…num panorama teatral, alheios à minha presença.
Enquanto “Flor-de-ervilha” coça a cabeça de “Bottom”, os “Elfos” percorrem o bosque perfumado… e ao longe, surgindo do nada, vejo uma sombra que me sorri, estendendo-me a mão. Mas…eu não a alcanço.
Oberon” e “Robim” discutem…e a figura começa a delinear-se… mas agora com um sorriso triste, por a não ter reconhecido…
À minha volta, os diálogos continuam como um sonho…"Oberon" e "Titânia" valseiam em palavras incompreensíveis… um vulto atravessa o denso nevoeiro e num gesto rápido empurra a figura que se começa a desvanecer ao meu olhar.
Oh dor profunda, uma lágrima incontida rasga a pele do meu rosto, enquanto a figura luta para se libertar e perceber o que lhe está a acontecer, enquanto a sua Voz eleva-se, para que eu a ouça…
Mas as personagens, como num sonho, abafam sua voz, tornando-a inaudível; mais que ao meu ouvido, uma voz chega-me ao coração, um dos novos personagens eleva o tom e virado para mim, faz esta alocução:

"Teseu" —
"Tanto mais generosos haveremos de ser, quando por nada os aplaudirmos. Prazer nos causarão seus próprios erros. Quando o pobre dever nada consegue, busca o nobre respeito unicamente a intenção, não o mérito. A minha vinda, sábios eminentes determinaram me saudar com longos discursos estudados. Tive o ensejo de os ver tartamudear e ficar pálidos, interromper uma sentença em meio, o nervoso afogar-lhes a palavra já tão exercitada, até que mudos se tornaram, sem dar-me as boas-vindas. Podeis crer-me, querida: do silêncio tirei a saudação, e li na própria modéstia da lealdade temerosa mais do que falar pode a língua fácil e a eloquência audaciosa e petulante. Fala mais o dever, com língua atada, muito mais, quando é mudo e não diz nada." (Citação)

Repentinamente tudo se evapora à minha volta: O séquito de "Oberon" e "Titânia", de "Teseu" e "Hipólita"… e o bosque transforma-se na minha praia favorita, onde uma chuva miudinha não impede o abraço que recebo... de quem? Da figura dos meus sonhos…enquanto como num filme animado ouço uma voz dizer…

Há quem diga que todas as noites são de sonhos.
Mas há também quem garanta que nem todas,
só as de verão.
No fundo isso não tem importância.
O que interessa mesmo
não são as noites em si,
são os sonhos.
Sonhos que o homem sonha sempre.
Em todos os lugares,
em todas as épocas do ano,
dormindo ou acordado.
(Shakespeare)

Mas… que sonho é este? Onde estou?
De repente, um frio percorre-me e completamente aninhada no meu cadeirão preferido, acordo deste sonho, ou terá sido mesmo um pesadelo?
Cai-me do livro um pequeno postal e, quando o apanho para o colocar de novo a marcar a página que não li, reparo naquilo que lá está escrito:

Conhecer alguém aqui e ali que pensa e sente
como nós, e que embora distante, está perto
em espírito, eis o que faz da Terra um
jardim habitado.
(Goethe)

sexta-feira, janeiro 12, 2007

Sem mãos...

Hoje que o dia surge sem mãos. Nasce e cresce, aqui como em qualquer outro lugar, onde não encontro, não me encontrarei mais.
Hoje que amanheceu assim, o dia... com a morte no olhar, a rondar-me, no meu olhar e eu choro... não morrer. Ver-me assim, estendida, deitada sozinha no quarto, com a companhia de outras mortas ou esperando a morte como eu, umas adiantam-se outras ficam esperando. Eu fico a fazer-lhes companhia.
Há a luz que entra vinda do corredor, percorre-te a cabeça quando entras pela porta na hora da visita. Já não consigo falar-te. Mas falamos sempre pouco. No tempo em que me batias gritava-te, no tempo em que amavas o meu corpo, gemia-te.
Estás velho. És velho como eu, mas mais lúcido, mais inteiro, a vida ainda não te roubou a força nas pernas, nem a morte te obrigou a semicerrar os olhos para poderes olhar o que ainda existe.
Tu ficarás só, no lugar longinquo onde vivemos os dois - tão longe me parece já. O teu olhar triste, trás já o sabor dessa solidão tardia que ninguem merece no fim dos seus dias. Mas ambos acreditamos em Deus e ele salvará a minha e a tua alma do inferno, num qualquer dia.
Estamos juntos. É o ultimo dia, tu não o sabes, mas és tu quem se vem despedir. Eu sorrio, os meus lábios não se mexem, a cama do hospital é imovel, mais imovel que a nossa cama. Trouxeste-me para aqui ontem, dormi sozinha... Tu não me querias deixar, mas há sempre os senhores de bata branca e o respeito que temos àqueles que julgamos saberem mais do que nós, ainda que não os conheçamos e nos peçam a confiança cega, e que lhe deponhamos nas mãos os que amamos. Saberás que é amor isso que ainda sentes por mim? Eu deixei de te amar. Não sei quando, nem porque incrivel pecado me tornei indiferente a ti. Mas a tua dor, essa da solidão, que podia ser mim, leva-me com um aperto no peito.
Hoje a morte amanhece o dia e morremos os dois, só eu o sei, mais ninguem...

by Ar, 12 de Janeiro, 2007

quarta-feira, dezembro 27, 2006

post-it # 6

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o que me incomoda, não é teres partido.
o que me incomoda é teres deixado a ausência.




foto de katia chausheva

terça-feira, dezembro 26, 2006

O Natal...

Querido Filho.


-No dia em que esteja velho e já não seja eu, tem paciência e tenta entender-me.
-Quando, todos comem e eu não conseguir; quando não puder vestir-me: tem paciência. Recorda as horas que passei a ensinar-te.
-Se, quando falar contigo, repetir as mesmas coisas mil e uma vez, não me interrompas e escuta-me.
-Quando eras pequeno, na hora de dormir, eu tinha de te explicar mil vezes o mesmo conto repetidamente até teres sono.
-Não me envergonhes quando não quiser tomar banho, nem me ralhes. Recorda quando tinha de andar atrás de ti e as mil escusas que inventavas para não tomares banho.
-Quando vires a minha ignorância diante das novas tecnologias, e te pedir que me dês todo o tempo necessário, não me irrites com o teu sorriso amarelo.
-Eu ensinei-te a fazer tantas coisas... Comer bem, vestir-te... e como enfrentar a vida.
-Muitas coisas são produto do esforço e perseverança dos dois.
-Quando em algum momento perder a memória ou o fio à nossa conversa, dá-me o tempo necessário para me recordar. E se não puder fazê-lo não te enerves, seguramente o mais importante não era a minha conversa: a única coisa que queria era estar contigo e que me ouvisses.
-Se alguma vez não quiser comer, não me obrigues. Sabes bem quando necessito e quando não.
-Quando os meus membros cansados não me deixarem caminhar...dá-me a tua mão amiga da mesma maneira que eu ta dei, quando tu começavas a dar os teus primeiros passos.
-E quando algum dia te disser que já não quero viver, que quero morrer, não te enfades. Um dia entenderás que isso não tem nada a ver contigo, nem com o teu amor, nem com o meu.
-Tenta entender que na minha idade já não é viver mas sobreviver.
-Um dia descobrirás que, apesar dos meus erros, sempre desejei o melhor para ti e sempre tentei preparar o caminho que tu havias de fazer.
-Não te deves sentir triste, enfadado ou impotente por me veres desta maneira. Fica ao meu lado, tenta entender-me e ajuda-me como eu te fiz quando tu estavas a começar a viver.
-Agora, toca-te a ti acompanhar-me no meu frouxo caminhar. Ajuda-me a acabar o meu caminho, com amor e paciência. Eu te pagarei com um sorriso e com imenso amor que sempre tive por ti.
Amo-te, filho.
O teu pai, a tua mãe, os teus avós...

«In memoriam». Todos recordam os pais e os avós de toda a gente.

(Texto e imagem de
Ceolino)


Que Hoje seja Natal
e Amanhã...
e Amanhã...

segunda-feira, dezembro 18, 2006

menino

Querido Menino

Sei que fazes anos.
Parabéns.
Anda meio mundo atarefado a preparar-te a festa. A tua festa de menino-deus.
Parabéns.
Olha, gostava que, se puderes, e não for assim grande maçada, que partilhasses a atenção que te dedicam, com outros meninos. Que enviasses a cada um dos meninos que nasce, no silêncio da dor, um dos homens que te acarinha. Envia-os. Não os prendas aí ao pé de ti, na tua festa de anos. Não os distraias. Deixa-os ir. Confunde-os, Mistura-te em cada um dos meninos que se angustia na desesperança de existir. Talvez assim os homens ( esses que te parabenizam) os vejam, os sintam, os oiçam. Há tantos por aí esquecidos a olhar-te, a chamar-te ( a chamarem-nos) e tu ( e nós), distraídos com tanta luz, não os ouvimos. Eu, quase já os não oiço . Já quase não gritam...
Certamente perderam a voz,
ou a esperança,
ou quem sabe,
a vida.
Ouro e mirra?
Para que te servem cousas assim?
Não sei se tenho tempo de ir à tua festa, não tenho ouro nem mirra, nem sequer cousa alguma.
Oiço gritos de meninos, oiço angustias, oiço vozes (tuas?) que me trazem lágrimas,
gotas de um nada,
acidas,
doloridas...Sim, tens razão deviam ser coloridas...
Festa de vida ( divina?) deve ser colorida, com luzes e estrelas, foguetes e alegrias. Mas olha menino, não leves a mal eu levar o meu olhar a outros meninos, de olhar cada um deles sem os ver, porque sei que eles estão por aí ( cousas de fé), omnipresentes a sentir silêncios e dor. Não me apetece festas, nem alegrias, nem luzes, nem cor.
Parabéns, menino, que tenhas muitos anos, e te faças homem, porque é essa a razão de cada menino, fazer-se Homem!

terça-feira, dezembro 05, 2006

A ti... que és eu...


Quero que saibas, que não me importas. Tal como não me importa tudo quanto aconteceu, não me importa tudo quanto não aconteceu.

Sinto-me hoje lúcida.

Cheia, talvez... dessa estranha lucidez que coloca a descoberto os sentidos e percebemos então o quanto somos de vazio.

Importa apenas que não seja lenta a passagem dos dias continuos. Que não haja mais esse interrupto movimento de estar constantemente fixa, parada.
Importa apenas que, embora as estrelas brilhantes não caiam, este silêncio seja rápido. Animal faminto e voraz, que se ultrapasse numa velocidade de luz, se devore, e desprenda todos os fios de articulação da vida-marioneta.

Quero que saibas que resta pouco... um vazio apenas e toda a lucidez.
Que importa não perceber a vida se ela for rápida, uma viagem de comboio, a mil à hora sem solavanco na partida, nem travão de emergência?
Que importa não ser feliz, se esse mesmo comboio, onde vamos, nos abalroar no caminho sem tempo para a infelicidade?

by Ar,04 de Dezembro, 06

segunda-feira, novembro 06, 2006

Desencontro


Guardo indistinto um momento...
Soluço.
Percorro inerte as pedras sedentas que formam todas as calçadas.

Somo passos.

Tudo é linear... Se visto muito de perto.
Mas sempre que olho o espaço que disto de mim, encontro imutável essa curva do caminho que me oculta quem sou.

Quando era criança - tempo de criança não cresce, decresce - a estrada era recta e encontrava-me sempre ali, meio irrequieto, metade de gente. Vivia insone no mundo fantastico que formado de ilusões não era maior que eu e tudo ao alcance da minha mão...
Então... era curto o espaço e menor o tempo, eu pensava e era eu.

Quando acordei de mim pensei em ser outro. Deixei esse caminho e deixei, renegada, a ilusão, acordei de mim.
Parti em direcção à realidade, a besta feroz de todas as insanidades.

Não há maior loucura do que ser real.
Troquei-me por quem os outros eram!

Soluço...
Se olho vejo, os meus sapatos de caminhar ao meu encontro, rotos e poerentos...

by Ar, 18 de Outubro, de 2006


Photo
Desprotegido, de Paulo Madeira

terça-feira, outubro 31, 2006

Volta...

Já sei pouco...
Cada vez menos... um ou outro passo deste caminho cego, turbulento, espiral de anestésicos e alcool, substancias de controlo do descontrolo.
Sei cada vez menos de como perder...
Creio que me encontro agora tendo já tudo perdido, sobrevivente ao que foi, parte estragada de sonho e quimera, sou sombra, retrato desfocado, longinquo de mim mesmo.
Hoje de repente acordo e chamo o teu nome...
Esta noite persegue-me como um poema que é apenas a métrica sem poema nem vontades. Tenho mil ilusões... quando abro as mãos percebo todas elas uma por uma a levantar voo.
Para lá de mim, despeço-me de mim, encontro-me numa esquina que insisto em abandonar. Pergunto ao espelho "quem és tu" o ser do outro lado, queda-se imovel na minha posição que é a dele. É assim que vivo, imovel, quedo numa posição que não quero mas é minha e o outro lado do espelho sou eu.
Vem! Deixa que chore ao menos esta noite, perdido entre os estilhaços.
Abro a mão, tenho pouco a oferecer.
Sei pouco...
Sim, sei pouco, cada vez menos...
Sei que o céu tem estrelas que estão sempre lá, dia e noite. Sei um pais de inutilidades...
Sei...
Um medo de quem eramos apenas... volta...

by Ar, 31 de Novembro de 2006

domingo, outubro 15, 2006

quero





Não te sei nome, nem história, vagueias por aí no silêncio de um grito. Conheço-te na angústia da dor que não se ouve. Na verdade não tens nome, porque nome nasce na família e, se a tiveste, perdeste-a no silêncio do teu grito. Queria saber o teu nome. Temos o hábito animal de só chorarmos os nossos, e só os nossos tem nome e rosto, só os nossos não são número, e os números não causam dor. Só os grandes números incomodam, mas gritam em silêncio, e tu és apenas um, e não tens sequer rosto. Já ninguém vê o olhar que escondes na sombra do Mundo. Quero saber o teu nome, e os outros todos que o não tem. Quero olhar os teus olhos e todos os outros que já não tem lágrimas. Quero-o saber porque sou animal, e os animais só choram os que lhe são próximos.

Resposta em silêncio ao alquimista

e à Betty



fotografia original de Finbarr O'Reilly ( esta foto foi alterada por mim sem autorização do autor, o original, sem desfocagem será resposto caso o autor, ou quem o represente assim o manifestar)

sábado, setembro 30, 2006

Na possibilidade, dos impossíveis...


Imagem daqui


Gosto do fresco do Outono, nestas manhãs de Primavera.
Sinto o vento bater-me no rosto e, como uma carícia o Sol pousa em mim…
Sinto a tua presença a meu lado. Vem. Dá-me um momento de ti…
O vento revolta o meu cabelo. Ou serão as tuas mãos?
Sinto o teu cheiro dilatar-me os poros e, deixo-me cair nos meus sentimentos.
A tua boca aproxima-se da minha… já ávida da tua…
Colo-me ao teu corpo, desejando que este momento não pare.
Um frémito percorre-me e, pouco a pouco, todas as sensações explodem em mil ritmos e eu estou ali a desejar, que me possuas, que desfaças em mim, todas as ondas do teu querer…
Sinto os teus lábios percorrerem o meu corpo, e impulsivamente, volto-te deixando que a minha língua tome conta de ti.
Sacio a minha fome do teu sabor, do teu corpo, explodindo num frenesim que te faz sorrir.
- És uma selvagem, leoa!
Mergulho a cabeça no teu colo, espalhando o meu cabelo, que acaricia todo o teu corpo.
Sinto as tuas mãos, agarrarem-me fortemente a cabeça, pressionando para que fique…
Sacias-te nos meus lábios, enquanto a minha mão percorre os cantos mais íntimos do teu corpo, fazendo-te gemer de prazer…
E cada vez mais louco, aproximas-te de mim, possuindo-me como se eu fosse a tua própria carne.
As nossas almas fundem-se num grito de êxtase, que nada pode deter.
O desejo intenso em nós, não se sacia de uma só vez e retomamos a viagem, até à exaustão do nosso querer.
Abro os olhos e sorrio, mergulhando em ti o meu olhar. Tu és o meu oceano, a minha fonte jorrante.
Na possibilidade dos impossíveis, como é bom sentirmos o nosso corpo vibrar…

(Memórias de mim… Maio/2005)

segunda-feira, setembro 11, 2006

11 de Setembro, ou qualquer outro dia

Texto junto às torres: “2.863 pessoas morreram.”
Texto junto ao homem: “40 milhões de infectados pelo HIV no mundo.”
“O mundo se uniu contra o terrorismo. Também deveria se unir contra a SIDA” .



Junto às torres: “2.863 pessoas morreram”.
Junto ao velho: “630 milhões de sem-teto no mundo”.
“O mundo se uniu contra o terrorismo. Também deveria se unir contra a POBREZA”.



Junto às torres: “2.863 pessoas morreram”.
Junto ao garoto: “824 milhões de pessoas morrendo de inanição no mundo”.
“O mundo se uniu contra o terrorismo. Também deveria se unir contra a FOME.”


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*Imagens de anuncio da MTV proibido nos estados unidos da américa
nota: este post foi executado em partilha com a surpreendida

segunda-feira, setembro 04, 2006

"Temporal"

Há palavras que nos tocam a alma. Palavras sentidas, arrancadas ao interior da alma, mas que se revêem em amplitudes naturais…
Palavras que não são nossas, mas que nos são oferecidas, como ramos de jasmim de mil cores, em marés azuis que se reflectem no tempo…
As palavras que vos ofereço, foram deixadas num comentário pela
APC, do blog Camuflagens e que resolvi partilhar…com a minha singela gratidão, porque existem palavras que são verdadeiros poemas...


Imagem de autor desconhecido

O tempo, esse, o do calendário, é um intrujão. Vale o da alma, que é o nosso!
Podem passar-se anos, sem se passar nenhum, entre o momento que foi e aquele em que o lembramos.
Porque não houve corte; a linha continua, sem início ou fim; feita de um sentimento, um só punhado de momentos, um só tempo...
É o tempo do amor, porque o amor não tem um tempo. Por isso temos todos tempo de amar.
A questão nunca há-de ser temporal. A questão são os temporais!

(texto da APC)

sábado, setembro 02, 2006

de mim,,,para ti, nesta noite que escurece sem sorrisos

Estou na varanda, Ao fim do dia, no inicio do escuro das estrelas
e
da lua, Pontos ao longe. Horizonte nocturno, onde a linha se transforma em pontos de luz, Olho-te,,, A ti, Sim, a ti, que te escondes na sombra lunar
e
desenhas lágrimas de sangue numa máscara fantoche,,, A ti que te foges.
Olho-te na angústia de te saber jovem,,, quase criança, Nasce-me uma vontade de ser um déspota
e
obrigar-te a sorrir, a limpar essas lágrimas ácidas,,, coloridas no vermelho, Proibir que as lágrimas tenham cor,,, As tuas,
e
as de todos. Percorro a escuridão que se diz noite, há procura do sentido que te leva na fuga, De ti.
Procuro o abismo, a queda que te embala, num vai-vem doentio,
e
sinto uma vontade desmedida de proibir a tristeza. A tua. Ela invade o céu, que se esconde na noite lunar. Escrevo-te, com a vontade de te levar a passear no presente
e
te apontar o longe
e
de te dizer que lá, no longe se esconde o sorriso de se viver, mas que para lá chegar, é imperioso ir, é urgente caminhar, sair dessa sombra lunar que te cobre dos frios, dos medos de te seres inteira.
Fica um beijo. Olho as estrelas. Pontos de luz que se escondem do dia. Pontos que no longe, lá no longe, são eles próprios,,, o dia.

teu, sempre amigo,

terça-feira, agosto 08, 2006

Memórias de... carta sem resposta...


Imagem de autor desconhecido

Queria ser capaz de ter as palavras certas para escrever o que me vai na alma....Mas não as tenho, sinto-me perdida no tempo e no espaço, perdida no meio da gente, no meio de ninguém...
Procuro os meus sonhos, aqueles que a ninguém confesso, procuro encontrar tudo aquilo que perdi e que nunca encontrei. Sinto, tudo como ontem, vivo no dia de hoje preparando o amanhã...Que me espera depois da noite? Que segredo me irá revelar o tempo? Anseio, por uma vida, por um sentido, por amor, por um sonho que já foi realidade....
Perdi-me no tempo...Perdi-me em ti.
Quero voar pelo mundo, quero conhecer o que não conheço, quero amar o que não amo… Quero encontrar um sentido para a vida...
Quero deixar sair o que me vai na alma...Quero, quero ou será que na realidade não quero o que quero. Sei o que procuro sem saber o que quero...Aspiro o ar que me envolve que me lembra a ti, agarro-me á fina corrente invisível que ainda nos liga e penso, penso no tempo, no espaço, no ontem, no hoje, no amanhã, penso no momento....
Deste-me tanto, deste-me tão pouco, deste-me o tudo e tiraste-me o nada. Sou tua profundamente tua, completamente tua e nada mais que tua, quero ficar contigo...Quero voltar ao passado, quero parar o tempo, o que sinto, o que receio.
Quero que leias isto que saibas o quanto te amo...O quanto passo as noites em branco em busca de ti...No frio que congelou na minha alma...Quero que saibas que o tempo não passa, não mexe, não evolui....
Quero que saibas, o quanto significaste, significas e significarás para mim! Tu és parte de mim. Eu sou parte de ti....Ambos somos o todo.
Nunca te esqueças de mim...Do amor que te dei. Do amor que recebi.
Sê feliz...

terça-feira, julho 25, 2006

são crianças, Senhor


Senhor, Escrevo-te,,, sim, a Ti, para que vejas, para que sintas, para que Te ENVERGONHES!
Pior que a morte, é a morte da alma de uma criança,,, Dessa criança que sorri e brinca com a crueldade de se deixar abraçar pelo ódio e pela indiferença.
Quando o sonho de uma criança se pinta nos olhos da morte, há qualquer cousa de irreal, qualquer cousa abjecta, animal, vómito, angustia, dejecto, excremento, podre que fustiga a alma,e nos devasta em temporal...

Que "cousa" é essa que engendra tão cruel imagem? Que povo é este? Que Deus é este?

Tivesse eu palavras!

Restam-me as do poeta,,, e resistir


Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.

Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento.

Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é Cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida.
Que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.

Pedra filosofal - António Gedeão

sexta-feira, julho 14, 2006

talvez não seja...( normal),,,talvez...

Não é normal, Eu sei (porventura, nem eu, o sou…), Dizia, Não é normal escrever cartas, a um cão, Sei-o ( disse-o já), mas hoje percebi que uma memória, é afinal,,, um fantasma, uma presença, um espírito, mesmo que seja a de um cão, ou de uma árvore, ou de coisa qualquer. Esta (presença) que me surgiu (hoje), acompanhou-me (no destempo de me perder no tempo) nos silêncios, das conversas sem fim, Escreveu comigo, páginas inteiras de apontamentos para um manual da serenidade, Ele dizia, e eu escrevia. Tinha linguagem só dele, codificada no brilho de uns olhos que não viam cor. Tinha nome esquisito. Pólo. Pólo não é nome de cão, é nome de Sentido, de lugar com sentido. (Só não lhe sabia qual, eu, porque ele sabia-o sempre).
Recordo dele,,, o fim.
Estranho este recordar, pesaroso de quem se arrasta na vida, esperando sereno na dor, o próximo passo, o ultimo passo,,, o passo do começar, Arrastava-se no existir, só para me fazer companhia, Insistia em não ir, porque o manual era (e é) só um esquisso desarrumado de apontamentos, disperssos...
Hoje apareceu-me, vagaroso, de olhar meigo, no silêncio da noite, Apareceu-me só para me olhar, como se tivesse medo que eu me esquecesse dele, porque para ele, o esquecimento é que está na origem da morte. Por isso me visita, por isso lhe escrevo cartas. Eu sei ( disse-o já) , mas preciso de o fazer, para não perder o sentir ( sentido?)…

terça-feira, julho 11, 2006

desenho, no silêncio do pó...

Tinha saudades, não sei ao certo se de ti, se da tua presença, Do teu estares aí, De teres ruído e existência. Tinha saudades de te saber . Por isso fui de passos ao teu espaço, e por ali fiquei a sentir os silêncios. Os teus e os meus. Juntos na mesma angustia-de-ausência, Tinha luzes de Natal,,, Ainda ( Imagina o tamanho da ausência e da saudade!). Fiquei a respirar e a desenhar, no pó das luzes, Desenhei um piano em cinzas-fumo, Ao longe, de pretos justos, com colar de garganta, cristal, pintei com os reflexos, uma voz de roucos-azuis, Melodia nossa, De sombras, De noite. Mais ao fundo, em janela (in)visível, um mar de gaivotas. Só uma eras tu, Todas as outras,,, som, Teu.
Saí sem fechar a porta, Não foi preciso. Fechaste-a tu, no leve de um adeus, em beijo de regresso…

terça-feira, junho 27, 2006

Cousas, Poucas...

Sei que andas por aí. (Ou talvez não?...Provavelmente, afinal, não sei. Sinto.). Por isso te escrevo. ( Mania minha de escrever saudade com palavras outras, saídas do impulso de te querer, Ver). Mas tenho cousas para dizer, Sem importância, Cousas poucas, Histórias do viver, Do meu ( que o teu, esse, não sei. Ou sei? Sinto). Passei o dia sentado, À janela a ouvir os sussurros das folhas, Encomenda, Do jornal, "O relato de uma folha, no antes de ser Outono". Durou o dia todo, mais a noite. Mas valeu a pena. Afinal as folhas, Todas, Partem da árvore para serem cor, Vestem-se assim, por nossa causa, (imagina. tu!) Dizem elas, que se não se vestirem de cor, ( daquela cor, só delas.) nós perdemos a capacidade de nos olharmos por dentro. O jornal, afinal, não se interessou pela reportagem, ( Era isto que te queria dizer, não outras cousas, essas, são a moldura de te querer por perto, Aqui, Comigo, Agora.) logo esta que me reportou tempos inteiros a escrever. Era cousa perfunda, Digo eu, Digo-te eu.
Paciência.

Beijos muitos

Ps: dize-me coisa qualquer. Tenho vazios de te ver.

terça-feira, junho 20, 2006

Carta, De chegar...

Escrevo-te, Hoje, Só hoje, Estive ausente, De mim, De ti. Não sei porque o faço, agora que cheguei, Só se escrevem cartas quando não estamos, Mas eu estou, Agora, Não sei por quanto. Sabes o quanto eu sou vagabundo de mim, Por isso sei que não estranhas só agora te escrever, Mas vi cousas outras que não tinha em mim. Vivi na inquietação da descoberta, Talvez por isso tenha perdido as palavras, Foram no entanto elas que me caminharam para o aqui, Para o hoje. (Letras-grão, letras-pedra, letras-que-desenham-o-caminho-de-volta, durante a construção do ir…)
Descobri cousas tão importantes que quase não ouso ver. ( ah como convivo mal com esta estranha cobardia de repintar a verdade em cores de aguarela!) . Dizia eu, dizia-te, eu, da descoberta, Imagina,tu que foi preciso viajar para tão de longe, de mim, para dar conta que só me era inteiro com a sombra, Logo eu que não gosto do escuro, porque quando me escondo no negro tenho a tendência louca de me por a sonhar. Foi preciso mergulhar-me para perceber que parte do sentir que me vivia no eu, estava precisamente lá. Na sombra.
Da próxima, levo-te, Comigo, Aprende-se cousas enormes! Até se aprende a ver cor na sombra que nos abraça o eu…
Recebe esta carta, que afinal nada diz, como um beijo.

terça-feira, maio 09, 2006

Nesta madrugada...

Fiquei presa a esta madrugada, sonhadora de mim e de todos aqueles que já compuseram outras madrugadas.
O café, bem quente como gosto, acabei de o fazer, no silêncio da noite e da minha casa.
Revivi, durante alguns momentos, tantos sentimentos que ocorreram em mim, nos últimos anos.
Não gosto de falar de mim. Gosto de falar daquilo que gosto.
Gosto de Poesia, daquela poesia que nos enche a alma e nos faz vaguear por mundos de sonhos, de risos, de lágrimas...
Porque este não será nunca um blog estanque, trarei aqui todo o tipo de poesia com a qual me identifico e os seus autores.
E, para terminar esta madrugada que vai longa, deixo um autor (para além de outros) que prezo muito.


"O poema me levará no tempo
Quando eu já não for eu
E passarei sozinha
Entre as mãos de quem lê

O poema alguém o dirá
Às searas

Sua passagem se confundirá
Como rumor do mar com o passar do vento

O poema habitará
O espaço mais concreto e mais atento

No ar claro nas tardes transparentes
Suas sílabas redondas

(Ó antigas ó longas
Eternas tardes lisas)

Mesmo que eu morra o poema encontrará
Uma praia onde quebrar as suas ondas

E entre quatro paredes densas
De funda e devorada solidão
Alguém seu próprio ser confundirá
Com o poema no tempo"

(Poema de Sophia de Mello Breyner Andresen)

(memórias minhas...)

domingo, maio 07, 2006

Carta da Insanidade do Sonho... #2


Meu amigo...
Meu tão caro amigo...

Sentei-me e dei por mim a poemar sobre a mesa riscada, sobre as palavras que haviam talhado na madeira.

Parece-me velha a mesa, ainda que suspeite que não o seja. Mas de repente pareceu-me velha e eu surgi perante mim envelhecido, homem de mim mesmo, mas envelhecido...

Por isso volto a falar-te desse homem que sou... deste homem que tal como quis não é ninguem mas tudo quanto sonhou. E no entanto, acordou a meio de um poema e um aperto no peito fê-lo temer que não haja já tempo para que nos conheçamos.

Porque se pode amar sem conhecer.

Porque a nós humanos nada mais resta do que amar o outro sem o conhecer. E o meu peito aperta-se. Esta mão atroz da vida pungente, do desejo de querer tudo... pára-me, meu pai! tudo isto me faz chorar... Porque é normal. Porque é sempre assim, porque sinto que vivemos sempre entre estranhos, mais ou menos proximos.

Olho, contemplador, através destas ruas que escolhi para viver no sonho...

Por vezes num jardim aqui perto, desses bairristas e tradicionais, onde imagino nunca demoraste o olhar, vou ver os velhos que jogam à batota. E há em mim, secreto, este desejo que não me concedo admitir, de te ver um dia no meio deles e talvez então pudesse entrar no circulo cumplice e sentar-me junto a ti, ou mesmo quem sabe, puxar-te para mim...

Escrevo entontecido esta carta. É que de repente a saudade chega toda por junto, pega em nós ao colo e larga-nos numa poça que não é de arrependimento mas de impotência e por isso mil vezes mais dolorosa e lamacenta. Esta impotência de poder contar-te as coisas não como elas são e sempre te contei, mas como as sinto e sempre as enganei.

No outro dia, um homem que teria a minha idade ou eu a dele, caminhava na minha frente de mão dada com o filho e eu dei por mim a interrogar-me - nem sei bem porquê ou com que necessidade ou talvez por isso mesmo, porque vivo sem motivos, segundo a segundo, apenas esta urgência de viver as minhas leis, penetrar no meu universo, cada vez mais denso, mais meu - se falando a um hipotético filho, que não terei, que fosse meu, esse mesmo neto que de certo já desististe de pegar no colo, lhe falaria das coisas como elas são ou como as sinto. Porque um pão é farinha de trigo e água e sal, mas também a noite da cozedura e o calor do forno e o trabalho que ajuda ao sustento de uma familia e o aroma aconchegante que atravessa a madrugada. E eu? Que saberei eu dizer a esse meu filho, que sei de repente, existirá, quando me perguntar o que é um pão?

Deixei arrefecer o café enquanto me ocorria tudo isto, assim, como vagas eternas de um mar inacessivel.

Talvez não saiba o que digo. Talvez esteja condenado a ser sempre aquele filho errado, incorrecto, tanta vez traidor dos teus sonhos, este da vida perdida, este que se perdeu, trocando o certo pelo incerto, a roupa do corpo pela nudez da alma, talvez tudo isto seja o mais certo, o mais verdadeiro, o mais real... Tão real como eu querer saber quem és, sabendo que não te amaria menos por te conhecer, se tu me deixasses agora. Porque é possivel que em algum momento das nossas vidas me tenhas falado no aroma aconchegante e nocturno do pão que cozia em alguma padaria distante e do suor agridoce do trabalho dos homens provocado pelo calor dos fornos e eu tenha visto nas tuas palavras, trigo e água e sal...

E hoje, de certo tardiamente, ofereço-te as minhas mãos abertas, mesmo que nunca leias estas palavras... E nas minhas mãos abertas a ti deposito o meu universo inteiro e este desejo de te explicar as coisas como as sinto, na vaga esperança de que me expliques, como a um filho pequeno, as coisas como as sentes... E nesta vida de desencontros, neste amor a desconhecidos, dêmos por nós, quem sabe um dia, a amar também a nudez um do outro...


by Ar, 18 de Março, 06


Foto:
I Will Follow, de Sérgio Redondo (olhares.com)

terça-feira, abril 04, 2006

Carta Escrita V



Não recordo ter chegado aqui...
Que pés foram estes que me trouxeram aqui sem que eu tivesse notado este caminhar distante, longinquo... lento?
Quantas vezes parei no caminho, julgando não o estar a percorrer ou pelo caminhando incerto demais...? Não penso. Não as conto. Esqueço-me da matemática metódica da vida.

Enluto-me numa tristeza sobre mim, julgando-me demasiadas vezes coveiro e encovado de mim próprio. Subtraiu-me a quem sou - a única operação matemática que ainda sei fazer - divirjo entre mim e as minhas (des)ilusões...

Sou o destino que não vive. Sou quem não vive o que lhe querem por vida.
Um dia nasci, recordei o inverno de estar sozinho.

Um dia depois de nascer dei por mim nascido e crescido. Era homem e no entanto ainda hoje tenho este incrivel medo do escuro, que tem vindo a derramar-se lento sobre toda a minha vida.

Sim!
Sim, desesperei-me em lentos detalhes!
Calei demasiadas vezes a boca, fechei outras tantas os olhos e sim...!, fiquei abanando o copo à vontade da miséria, essa eterna amiga que sempre vem, que sempre se tem aproximado com passos ténues e sobreviventes a tantos cansaços.

Sinto-me hoje o ultimo homem.
Aquele que tudo já perdeu e oscila agora entre um ou outro caminho, sabendo apenas, ocasionalmente, que nada vai alterar este ter existido até aqui, semi-humano, semi-mundano...
Semi-Eu!

Sim!
Sim, zanga-me não ter sabido ser!

Foto:
Contemplando a Solidão, de pedrogneves (olhares.com)



by Ar, 08 de Março, 06

quinta-feira, março 16, 2006

Uma Carta de Mar...

Vagas..., de João Radich (olhares.com)


Eu não quero que o mar saiba essas palavras que não ouves e conheces... Nem que o vento transporte como folhas esse emaranhado de sentimentos e pensamentos que é a confusão de existir. Eu não quero que eles conheçam essa existência do que existe entre nós e nem nós descobrimos quando nos olhamos, calados, silenciosos, receosos... dessas palavras, que nem o mar pode ouvir...

E sei que um dia se lamentará (mas quem? qual de nós?) a inexistência do verbo ou do tempo verbal, da palavra fecunda que estéril permaneceu sufocada na garganta de cada um e depois permitiu-se assim o vazio... E sei que prosseguiremos pela estrada fora, tentando convencer-nos de que o vazio é tudo quanto existe... apenas porque... essas palavras que não são para o mar, são nele deitadas, deixadas levar para longe...

Contemplo o mar, sentado na esplanada. Este mar meu que pressinto como se me tivesse visto nascer e eu fosse parte dele... e há minha frente este papel amarrotado, escrito na urgência da solidão do momento diz-me que eu não quero que o mar saiba essas palavras que não ouves e conheces fingindo não conhecer... e sei que é tarde - o mar já as sabe...


by Ar, 16 de Março, 06

segunda-feira, março 13, 2006

carta, a lápis...de carvão

escrevo-te. a ti. que escreves cartas no escuro da noite. de noite. por um nada. escrevo por nada. agarrei no papel e no lápis. podia ser na guitarra e deixar que os dedos ferissem a noite, com um fado não cantado. não chorado. dedilhado na noite. mas calhou-me o lápis. de carvão. apenas porque hoje, é ele o meu companheiro da noite. esboço a vida de noite, como quem desenha a beleza. primeiro, o esboço, depois as linhas, só mais tarde , no amanhecer, as cores…
escrevo-te. a ti. porque só ( tão só, porque foste tu que me entraste na noite). não tenho portas, nem janelas, por isso entraste de leve, como a cor de uma aguarela a percorrer as veias do papel, em suavidades de brisa…
não tenho que te dizer, faz de conta que é guitarra que toca a embalar as estrelas…nem sequer tenho pergunta, ou história para te dar. estou aqui no silêncio de um esboço, a fazer-te companhia, no escuro nocturno da noite. da tua noite. com um papel-guitarra a saltitar no esboço das estrelas. tal como tu, também a lua entrou ao de leve para me segredar as cores dos furturos que se escondem no escuro do amanhã.
por isso aqui estou, a escrever-te. a ti. que desenhas anjos de asas negras, (tão iguais a todos os outros anjos...) para que não façam barulho e assustem os sonhos que (te) habitam na noite que demora a pousar suave, no dormir…

domingo, março 12, 2006

Carta Nocturna IV


Sento-me lenta, desfazendo o olhar na cortina esvoaçante.

O luar entra pela janela aberta aguardando-te, guardando-te... por dentro, onde se fixam as prisões perpetuas...

Acordo insone, insolente perante mim mesma e insisto neste acto desesperado, esperado, de te esperar.

Esperei-te o dia todo. Esperei por ti toda a semana, inteira, vendo-a passar... acabar sem ti.

Esperei o mês que passou e todo o tempo que passou e tu não passaste em frente da janela que te aguarda nem uma só vez, um breve instante, em que o meu olhar pudesse pousar no teu e talvez...

Queria perder esta mania de esperar e guardar dentro... desencostar-me das almofadas... desviar o olhar da cortina... cerrar a janela ao que de mim sai...

Queria um movimento que incapaz nem desejo é, porque não o quero verdadeiramente. Sei apenas que por vezes acordo assim, como se ainda te esperasse e tivesse esse direito...

by Ar, 12 de Março, 06


Foto
All Those Years Waiting for You II, de Angelica

terça-feira, fevereiro 21, 2006

Carta Nocturna III



Estou aqui, de novo... sempre...

Acordo a meio da noite... a esta hora de silêncios e solidões, numa cegueira incessante. Receosa ergo-me, precipito-me, fujo de mim, dos lençois desalinhados, da cama que quente é a prisão do corpo, que fria o carcere do ser. Da prisão que a vida por viver vai tecendo em lentidões várias. Sufoco aqui...

Este reflexo dos candeeiros, dos carros que ocasionais passam na rua não coincide com o marulhar do mar que eu ouço... que talvez só eu ainda ouça, atravessando o ar, trazido numa leve brisa até esta janela, aberta para a escuridão... para o vazio de me encontrar aqui dentro esperando-te do lado de fora.

Estou aqui, como sempre, desde sempre esperando-te...

Na janela aberta ao ar liberto... que não sufoca... que tráz a ilusão da liberdade como polén que estranhissimas arvores soltassem para nos salvar, e o sonho de que o coração ainda pudesse ser esse motor que move as vidas e os encontros...

Espero a tua ausência, espero todos os dias o momento em que, como este, a ausência avassaladora de ti me devolve um pouco de presença... um momento em que ainda sinta, nem que seja este sentir lento de não ter, que incontornavel revela sempre a verdade, compondo o verbo, emendando, de não te ter...

E o mar vem, num ruido nocturno como as coisas doces, é como aquele velho e único amigo, diz: "Vem, repousa a cabeça no meu respirar, solta a tua dor na minha imensidão"... Vem ter comigo, numa companhia silênciosa, um dar de mãos que faz sempre falta...

Aqui da janela fria não o vejo, ouço apenas...

Aqui onde espero a tua ausência, sem mais que esperar, onde não te vejo, nem ouço, sinto-te apenas, o mar é o ruido e as estrelas o brilho desse tempo que vai fugindo, escapando indeterminado neste tempo de espera e ausência...

Perdoa-me, acordei e dei por mim a sentir-te...



Foto:
Will You... de Sweetcharade (olhares.com)



by Ar, 19 de Fevereiro, 06

sábado, fevereiro 11, 2006

Carta Nocturna II

Esta noite esqueço-me e parto para longe... Flutuo sobre as ondas num brilho de luar que entontece... moléculas de água... particulas suspensas na atmosfera... Transfiro o meu corpo para um sopro de vento que me leve...

Desculpa se a insonia me devolve a ti...

Esta noite sou a leve poeira que sobra de um sorriso, esse que resta no fim da tua gargalhada que mal notas que eu vejo e talvez nem notes essa poeira, resto de tudo... Por isso fixo no marulhar distante das águas que se aproxima da janela a incandescencia de te conhecer a voz.

Permito que a insonia me devolva a ti...

Enrolo-me esquecida no cobertor, esse que vem agasalhando a meterologia das estações que passam sem que estejas presente e o fundo de uma lagrima que aquece o rosto sem se deter por mais que o tempo necessário à sua descida. E é quente este cobertor, quando o coração tem a paciência de não se inquietar, e aquietar por momentos no momento languido de te sentir presente e constante...

Abro a janela, aperto o cobertor e o cigarro entre os dedos...

Esta noite esqueço-me e parto... no distante marulhar das águas que aqui chega... aproximando-se...

by Ar, 10 de Fevereiro, 06

Foto:
Emoções Fortes, de José Gama (1000imagens)

domingo, fevereiro 05, 2006

post-it # 5

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Como dizer-te que me deixo vencer pelo que não sinto e me entrego à fome de te pertencer? amamo-nos e perdemo-nos mesmo sabendo que essa perda acontece quando nos perdemos um do outro.


(k. chausheva)

domingo, janeiro 22, 2006

Olhar...


Imagem daqui


Não sei bem quando foi que o meu olhar se abriu…
Apenas sei que havia um caminho: o céu, o mar e eu…
Íamos andando silenciosamente e nascia do ar uma música levezinha, feita do calmo encantamento do vento sobre os campos.
À nossa volta nasciam papoilas sorrindo.
Vinha ter connosco o perfume suave que fugia dos campos escondidos e dentro de mim, deslizava um grande mar de emoção.
Então eu descobri, o sorriso trémulo da papoila, mais leve que música embalada pelo vento…
E quando o sol tombou nos meus olhos cansados, de mansinho senti que em cada adormecer do olhar, há também um poente. Porque no pressentimento da noite, a luz quieta veio descansar no vermelho do entardecer, o brilho fugitivo e doce da tarde, na força pura das árvores solitárias, acompanharam-me na calma do mar que adormeceu no meu coração.
E quando a noite era já profunda, eu peguei na música do vento e no meu sonho e fiz daí um hino comovido ao mistério das estrelas que vieram chorar os seus desejos brandos sobre o mundo e dizer-me da esperança de Viver…

Há no meu olhar sorrisos de ternura…porque a vida é um oceano onde nos encontramos a navegar, porque é…

O sol que nos aquece
A noite bem dormida
A esperança que não morre
A força permitida
A magia que não esquecemos…

…e o sonho que ainda comanda as nossas ilusões…

domingo, janeiro 15, 2006

Carta Nocturna I

Bebo água... levanto-me, abeiro-me da janela, espreito o silêncio da rua, estes dois andares abaixo de mim... Olho o céu, num incomodo em mim que não reconheço viro-lhe as costas.

Creio que esta noite as estrelas cansam-me...

O meu olhar bate na cama que não me chama... deito-me, viro-me, reviro-me, tapo-me, volto a destapar-me... Estou incerta hoje, não sei de mim, abro os olhos perante a escuridão convencendo-a de que não a temo. Há minha frente a mão vazia que se estende na direcção do candeeiro, sustenho o gesto... levanto-me novamente.

Há o candeeiro da rua, aquele do outro lado, velhinho e ferrugento... por momentos distraio-me.

Não sei de mim...

Abro a janela para que o frio me aqueça a alma. Um vento que vem de longe, uma memória que faz os cabelos esvoaçarem em frente do meu rosto... Queria voar daqui para fora, lançar-me no vento, acalmar esta impaciência, esta inquietação.

Sento-me na cadeira em frente da secretária... Deito ao papel palavras como se cravasse os dentes na tua pele, mansamente, vorazmente, suavemente...

Levanto-me, abandono tudo... O vento faz as cortinas esvoaçarem. A suave luz do candeeiro ferrugento está ali, do outro lado da rua. Permaneço a meio caminho indecisa entre os lençois revirados da cama vazia e as estrelas caóticas no céu.

Não sei de mim esta noite... As estrelas chamam-me o olhar.

Desculpa... dei por mim a amar-te novamente...

by Ar, 15 de Janeiro, 06

Foto

No Guilty, de UGLY (olhares.com)

quinta-feira, janeiro 12, 2006

Carta Escrita IV


Não...

Não me repitam as mesmas velhas lições estafadas. Não... Já não quero aprender nada, já não quero ser nada. Vou ficar apenas aqui... Aqui ou ali, onde calhar o corpo pousar-se, inconcreto, fora de mim, de si, de todos...

Não me venham com sonolentas palavras, aquelas sábias palavras que servem apenas para esquecer. Sinto que perco tempo... Aqui ou ali... Em todo o lado, por todo o lado.

Convergente a mim carrego todas as divergências de um ser que se aquietou de repente, e no infimo espaço entre si e o seu EU descobriu que não precisava já de lutar contra os outros, bastava-se...

Travo a batalha derradeira contra mim!

Remexo-me, melhoro-me, armo-me. A cada dia que passa eu sou este momento dissintonizado dos minutos cronologicos dos outros. A cada dia encontro apenas segundos de mim.

Não tenho passado, não tenho futuro, a cada momento esqueço a existência de todos os momentos, até a deste... Como esperam então ensinar-me algo?

Não... Eu sou aquele que não quer aprender! Dizem que cresça, dizem que faça, dizem que aprenda... Pois eu digo a palavra ouvida e repito-a incansavel: NÃO!

Não aos vossos horizontes flácidos. Não aos vossos sonhos quebrados e desorientadamente organizados. Não às vossas palavras fragmentadas no reflexo da mentira.

Não! Mil vezes ouvido, repito-o agora, agora que me querem razoavel, eu que fui sempre razoavel, não, não mais, agora que me querem humano, eu que tive tantas humanidades até perder a humanidade falsa de ser humano, não!

Vou apenas ficar... aqui ou ali... onde o corpo encontrar abrigo e se não o encontrar permanecerei nos segundos deste momento que começo já a esquecer...

Não! Em mim o passado não pesará mais, nem o futuro me arrastará como um condenado pelos Deuses brincalhões do Olimpo. Já não creio em Deuses...

É contra mim que vivo!


by Ar, 12 de Janeiro, 06

quarta-feira, janeiro 11, 2006

post-it # 4

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quero dizer-te da melancolia.
enrolei os dias esquecendo-te. esgotei a ternura, não soube onde encontrá-la.
e sem saber, no silêncio das palavras invocava o teu coração.



*foto de katia chausheva

terça-feira, janeiro 10, 2006

post-it # 3

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recorto a cidade em angulosas linhas e coloco-te ao fundo. pousado em perspectiva. definida por sentimentos paralelos dos dois lados da rua. imagino que deves ter passado, marcando os passos no eco da ausência. não te vi. tinha o olhar preso no centro da minha vida onde resguardo o coração. na memória, e porque tudo é apenas memória, o teu rosto não se distinguiu dos outros. é por isso que na geometria dos sentidos os sentimentos paralelos nunca se encontram.



*foto de Cartier Bresson

segunda-feira, janeiro 09, 2006

post-it # 2

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olho-te de tão longe.
no meu regaço espalho palavras, liberto-as da clausura de mistérios como bagos soltando-se da árvore. espalho-as em pequenas nuvens pairando na distância. à longa noite roubei sons mas nada se ouve. ou talvez apenas queira que o meu silêncio não te desperte.
nesta página onde dançam sombras que sinais ficam depois da mágoa...


*foto de mateuszg

sábado, janeiro 07, 2006

post-it

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junto à fina seda da espera, olho os lugares do passado e de novo encontro o jeito de adormecer nos dedos os doces frutos da solidão. as folhas desta página abrem-se à saudade, como gotas de chuva sob o labirinto das palavras tanto a pele absorveu o travo da ternura que o tempo não roubou. talvez tenhas partido e eu toco apenas o sonho no meu corpo. e deito-me, repouso no centro perfumado da minha mágoa.





*monalli

sexta-feira, dezembro 30, 2005

Sem Mais Deixo-te Esta Carta de Mim


Azul, de João Vasco (1000imagens)



Nasceste hoje e tenho já tanto a dizer-te... Por isso decidi, minha neta, meu amor, fazer breves estas palavras que nunca chegarão para te ensinar tudo quanto não aprendi.

Tu nasceste e eu morro... Porque a vida é assim e Deus, que fica algures neste universo perdido, nem sempre parece correcto e encurtou-me a vida. E de repente fico com esta impressão de que não vivi e errei, e queria poder ver-te crescer para emendar todos os erros.

É verdade que não fui uma mãe atenta, deixei o teu pai crescer sozinho, um menino de calções, tão perdido quanto eu. A vida é confusa a todos meu amor. Mesmo depois de adultos não estamos menos perdidos...

Ocupei-me em milhares de coisas, procurando obter outros milhares de coisas que me circundam agora e perante o telefonema frio desse homem que é meu filho e teu pai, que nos une, anunciando a tua chegada, a unica coisa que queria é o teu amor e se possivel, como quem tendo a lua deseja ainda as estrelas o dele...

Fui tola como nenhum tolo pode ser, fui tola achando que teria tempo, que poderia deixar para depois o tempo de estar com ele, de estar comigo, o tempo passou. O tempo meu amor não se recupera... Mas não é isto que é triste, triste é perceber que mais que o tempo perdemos aquelas que seriam as recordações que fariam o coração quente e cuja ausência o apertam numa inquietação constante de algo que é impossivel de alcançar definitivamente.

Por muito mais que isto, por tudo isto, sem mais que isto, preciso de dizer-te, hoje que nasceste, o quanto te amo, o quanto viajo e vivo esses momentos que nós as duas não teremos, mas que aquecem o meu peito. Não tenho conselhos a dar-te.

A vida vivesse conforme nos surge, é com ela que vamos aprendendo como se vive e no fim da lição pode parecer tarde, mas vem uma paz de finalmente termos descoberto que a sua simplicidade é bela, que são as coisas que vêm sem papel de embrulho, e sem etiqueta de preço que são verdadeiramente importantes e caras.

Meu amor erra o que tiveres de errar, não temas os teus erros mais que os erros dos outros, nem odeies os erros dos outros mais que os teus. O erro é só um caminho, por onde os nossos passos vão alisando a terra, até que o caminho seja confortavel...

Sem mais, minha neta, meu amor, deixo-te esta carta de mim, e o sabor de uma lagrima que teima em cair, de felicidade, esta magnifica felicidade, de saber que chegaste.


by Ar, 30 de Dezembro, 05

sábado, dezembro 24, 2005

Carta Escrita III


Tenho que dizer isto, urgentemente, insanamente, apressadamente... Dizê-lo por onde passo, onde existo, onde sou. Dizê-lo a todos, no café, no bar, nas esquinas que dobram as ruas por onde passo, onde tantas vezes os meus passos têm sido dados de cabeça baixa para os fazer seguros. Tenho que dizer isto que nem sei bem o que é, isto que é ser, que renasce e redescobro sem nunca ter perdido, nem esquecido, nem matado em mim.

Deixem-me escrever, delicadamente, eu que não sei como se escreve, sem ser assim, letra atrás de letra, eu que sou como aquele outro homem igual a tantos homens, meu pai, meu filho, meu irmão, eu que tenho sido tudo por mim e tanto contra mim, preciso escrever. Palavras desgarradas, que encerram em si esta essencia, este percurso que até aqui fiz, percebo cada vez mais feito por mim, erguido com as minhas mãos temerosas e seguras.

Sinto em mim arder esta vontade de falar e contar, de dizer a todos isto que me arde debaixo da pele, que a faz rebentar se lhe imponho o silêncio, descobri em mim o homem que procurava, arde Deus, mas existe!


by Ar, 23 de Dezembro, 05

sábado, dezembro 17, 2005

Feliz Natal...


Imagem daqui


Para todos vós...

quinta-feira, dezembro 15, 2005

Carta ao Menino-de-Sempre

Menino, meu Menino,

que Te trocam as voltas, Te esquecem o nome e Te substituem por um velhote de vermelho vestido que só traz presentes…
Meu Menino de olhos doces,
que numa noite longínqua trouxeste a Esperança
e, em Teu nome, os Anjos cantaram a Paz a todos de boa vontade…
Meu Menino, hoje e aqui, olhando-Te em mais um Natal que chega, vou escrever-Te com-palavras-do-coração:

Meu Menino, deitado eternamente em palhinhas,
olha pelos outros meninos-tão-meninos como os outros mas que não têm eira nem beira.

Meu Menino dos cânticos de amor,
olha por todos os meninos sem carinho e que só sabem o que é sofrimento.

Meu Menino da igualdade entre os meninos-de-sempre-e-todas-as-eras,
olha pela justiça e equidade entre os homens.

Meu Menino, há mais de dois mil anos nascido,
promessa da Vida e do Caminho,
do perdão, da união, da verdade,
olha pelos meninos que não têm razão para sorrir.

Meu Menino, que moras em redenções e vontades adiadas,
Olha por todos os pequeninos, meu Menino.

Meu Menino, oh meu Menino,
Ouve as preces dos outros meninos
e deixa-me ver-lhes nos olhos
esta ventura de ser de novo Natal.

terça-feira, dezembro 13, 2005

antes que chegue o natal, desenho a tua cruz...menino

despido de palavras escrevo.
de olhos sem sentido, apenas para libertar um grito que se silencia sem espaço.
não tem espaço, nem voz, este grito que me cresce nas entranhas. é lágrima guardada nos olhos de um menino que não sabia sorrir…nem chorar.
por isso escrevo de raiva, solto de ódios porque a raiva é minha.
inteira.
interna.
minha, de um eu que se atrofia em silêncios, porque SEI mil e muitos meninos desenhados em forma de cruz.
esses,
exactamente esses que já não gritam a dor, porque só a ela conhecem.
a ela.
à cruz.
à indiferença.
têm lágrimas de lama.
sujas.
lágrimas-de-cristo.
todos os dias nascem, mil e muitos meninos-jesus. com cruz.
e eu aqui a festejar os mil e muitos meninos-jesus com a mesma indiferença do homem que desenhou essa, mesma cruz.
sou,
também eu,
filho-do-homem-que-desenha-meninos-de-lágrima-seca ( suja, negra, esquecida, vazia em silêncios, soluços-engasgados-de-torpor).
escrevo desalmado com palavras a fugirem-me dos dedos.
queimam.
as palavras que me nascem nos dedos.
têm cor de sangue.
não há dor maior que a indiferença de desenhar uma cruz em cada olhar de criança que já não sabe a dor, porque simplesmente é o desenho dela própria.
da dor.
de criança.
de homem.
que nasceu abraçado a uma cruz.
a cruz tem forma de homem.
e caminha,
também ela indiferente, embrulhada em natal.
hoje estou assim...destilado em veneno de homem, talvez por me sentir só entre mil e muitos outros homens-sós que se puseram a contar os mil e muitos meninos-jesus que nascem ao acaso nos dias-todos, desembrulhados, sem natal.
desagua -me a raiva em forma de grito surdo ao me sentir homem que se finge homem.

isto não é afinal carta, nem cousa alguma, é um rio de sangue que se acumula no olhar.
é mão de pilatos que se desenha a rezar…

sábado, dezembro 10, 2005

A todos os amigos e conhecidos

Queria aproveitar a época para vos agradecer as resmas de cartas que me escrevem, os conselhos e sabedorias que me enviam, as gargalhadas que me provocam e sobretudo por me atafulharem a caixa de correio electrónico.

Não tem importância nenhuma o facto de nunca escreverem o meu nome nos e-mails que me enviam e de para além de mim, mandarem-nos a mais quinhentas pessoas, isso é pormenor de somenos importância.

Gosto deles na mesma. São coloridos, trazem filmes e músicas, jogos e sei lá que mais, um divertimento sem igual. Guardo-os todos num sítio especial, tão bem guardados mas tão bem mesmo que já nem sei onde estão!

Meus(as) queridos(as) bem hajam e mandem sempre! A reciclagem do meu computador agradece. Cada vez está mais gordinha!

Maria (a moura)



Winter wonderland

sexta-feira, dezembro 09, 2005

sem nexo e sem lógica...



Sinto o vento bater na vidraça da janela...
Pressinto, mais que vejo, o sol a baixar em direcção ao mar...
Oiço a música em final de filme, que passa algures numa dependência da
casa...
E apetece-me escrever...
Escrever palavras soltas, sem nexo e sem lógica!...
Palavras à solta, na miragem da imagem que me turva o pensamento e enche
meu coração!...
E tenho saudades...
Saudades dessa imagem, que é agora uma miragem...
Na miragem da imagem de um amor que fez nascer, a palavra saudade no meu
pensamento...
Saudades de palavras ditas com coração,
E tristeza das que foram ditas sem paixão...
Saudades de beijos longos e ardentes...
E, agora negados sem razão...
Saudades de ser criança, de ser menina carente,
De mulher fremente, de amiga e amante!...
Mas como viver, sem saudades?

quinta-feira, dezembro 08, 2005

tua

um impulso sem medida nem cor, quase febril arrastou-me palavras. letras dispersas, que se (des)formam num deserto. dunas vermelhas de horizonte. não consigo dizer. dizer-me o que sinto. o que não sinto. também. é este não sentir que me cega que me ceifa a seiva e se transformam em letras-duna. sede(s). os passos pesam. mais que nuvens. são passos raízes. sem árvore. tronco sem folhas. esta cegueira  que me entalha a alma. por isso escrevo-te esta carta. sem endereço. é carta tua. TUA. porque as letras são ninguém. porque as letras soam a voz da negritude de um deserto. eu já não falo. já não vejo. escrevo. pinto. o que não vejo. pinto-Te.

quarta-feira, novembro 30, 2005

Carta Escrita II

Não sei escrever cartas...

De facto nunca soube escrever nada, limitei-me a enganar a verdade com palavras e na composição estranha do desenho das letras descobria por baixo da mentira, para lá da ilusão uma forma de diamante, embrutecido, pressionado nas profundezas de um solo árido, algo que inominável impulsionava o gesto de redesenhar as letras novamente.

Repito, no entanto, nunca soube escrever!

Quando era pequeno e tinha as mãos pequenas e os olhos pequenos e o mundo pequeno cabia nas minhas mãos pequenas, nos meus olhos pequenos tudo me parecia demasiado grande para os meus desejos, de tão pequeno - julgo agora - que tudo era e tão pequeno que era eu, que podendo desejar nada desejava. Agora que cresci, e as minhas mãos palpaveis se tornaram grandes e, o meu olhar maior se fez e, o mundo imenso escoa pelas minhas mãos - estes dedos grandes abertos - não possuo desejo maior que este de não ter mais desejos...

É que nada curva mais o homem que o ter desejos e fazer-se de sonhos.

Sei-o e sei que sabê-lo é já ter uma âncora no pescoço e as asas agarradas a meio do voo sobre a planicie. Porque esse desejo de não ter mais desejos, de dormir sem sonhos é a maior castração da humanidade.

Por isso hoje, que admito tão abertamente ter iludido, ter enganado verdades, não saber escrever e escrevendo esta carta... tão contraditorio hoje como sempre, entrego-me nos braços desses desejos menores, dos sonhos inatingiveis e infinitos que devia ter tido quando tinha as mãos pequenas, agora que percebo nas minhas mãos grandes a eternidade do fim dos dias...


30 de Novembro, 05

terça-feira, novembro 29, 2005

Carta da Maternidade


Behind Blue Eyes#, de Claudio Marcio Lopes (olhares.com)


Meu filho, tu que chegas andando e falando...

Por quem eu não esperei nove meses, mas a vida inteira... Quem eu amei muito antes de teres nascido...

Tu que não és carne da minha carne nem sangue do meu sangue, mas parte do meu ser, ser do meu ser, desde sempre... Tu que chegas como a luminosidade por entre a escuridão ou o caminho na solidão do deserto e como de água se tratasse ofereces-me o viver...

Tu que não és meu filho de facto - dizem - mas de coração, de amor, de alma, de algo indistinto, circunflexo, convexo, incontornavel, que trazes nos olhos a minha esperança e este meu olhar novo de criança pequena, tão pequena quanto os pequenos passos com que vens caminhando, com que toda a vida caminhaste na minha frente, com o poder de me devolveres este amor por mim e pela minha vida, porque ela já não é minha mas tua, tua e minha...

Tu que és meu filho e me dizes no silencio essas palavras que não se ouvem e sentem apenas...

Vens sorrindo da dor, para repor em mim esse passado que necessito, dar-me um mundo novo onde tudo se possa corrigir e devolves em esperança e promessas tudo isto que te dou e é tão pouco...

Meu filho - que dizem não seres, que errados estão por pouco saberem - vem devagarinho ao meu encontro, como velhos conhecidos que somos, trazendo contigo a velha palavra, inegavel: maternidade... mesmo que pareça que fui eu quem te procurou e encontrou e salvou.

Meu filho, tu que foste sempre e eternamente meu filho... ainda que demores a chegar... ainda que não chegues...


29 de Novembro, 05

segunda-feira, novembro 28, 2005

A carta que não te enviei...



Caso tenhas saudades de mim, olha as estrelas…

Lembra-te do meu sorriso. Olha o sol, vê nele o brilho do meu olhar, quando te via.

Por fim, quando vires o pôr-do-sol, lembra-te da despedida que não tivemos!

Se este pôr-do-sol vier acompanhado de uma chuva leve… lembra-te então das minhas lágrimas num dia de chuva, que lavaram a minha alma e levaram um amor, sincero e puro.

Quando vires nascer este mesmo sol, e um novo dia começar, lembra-te também, que tudo que renasce, vem com mais força…

Se algum dia tiveres vontade de chorar, lembra-te das minhas lágrimas, da minha mágoa e do meu imenso amor.

Pensamentos confusos sim, vão surgir!

Saudades, também!

Porque elas não são presente; mas são a prova que fomos felizes e que foi realmente lindo tudo o que vivemos e tivemos.

Então sorri… e lembra-te que a nossa história ficou escrita nos nossos corações…

E quando as lembranças resistirem e se recusarem em ir… vê nascer este pôr-do-sol, imagina a beleza que foi o nosso amor.

Lembra-te da nossa história…

E sorri!

quinta-feira, novembro 24, 2005

ás palavras que me fogem

a ti, que não entendes o meu sentir...

Sempre me soube estranho. Até estas palavras que se soltam quase sozinhas as sinto estranhas, porque já ouvidas mil vezes em formas várias de sombras. Talvez seja apenas cansaço, talvez seja um quase nada, mas se há palavra que me irrita o Eu e o ser é essa mesmo…"TALVEZ". Gosto das letras do "QUASE", por que tem caminho. "TALVEZ", perde-se no querer e no horizonte. Dias, seguidos a dias, fui escrevendo com o sentir. Sempre com o sentir. Mas hoje, germinou em mim uma negritude inexplicável, por isso não a tento, nem relato. É um quase querer ficar por aqui, como quem corta a dor, como quem fecha uma porta e segue sem olhar o horizonte que se esconde por detrás da sombra-que-se-adianta-nos-passos. Vou por isso ficar por aqui, sem mais letras. Fico com o sonho. O meu. Egoisticamente meu, de um dia me ter deixado enamorar pelas palavras. Talvez esteja cansado, mas vagabundo que sou, vou por aí sem direcção, vou ouvir e ver o existir… Esse mesmo, esse Existir mágico, que tem uma continuidade que nos serena, em que tudo continua, diferente…TALVEZ, mas continua. Sempre. Por isso sorrio mesmo com a dor do fugir. Porque na verdade Fujo, não de mim, mas de um Eu que se envolve no sentir quase cego, quase autista e que flúi em palavras que tomam vida em diabruras que não sei. Dias, seguido de dias… é essa a realidade, é essa a cor com que sonhamos um dia, viver um dia único de cores únicas, exclusivas do sonho que procuramos no EU. Todos os sonhos são diferentes, porque esse instante tem a semente de cada um. Não vou dar nome a esse instante, porque ainda o não sei nem senti, por isso vagabundo-ME, por isso vou por aí. Desta, vez outra,…sem palavras…Só…com o VER! Um abraço Posted by Picasa

quarta-feira, novembro 23, 2005

Tão breve como um momento...

Lamento que seja assim...

Lamento este silêncio instalado, alojado nos gritos, nesta falta de comunicação... lamento esta falha inerte, inamovível no diálogo que por nascer é um feto cadáver entre nós.

Hoje saído do nada resolvi escrever-te, escrever o quanto lamento já não saber dizer desculpa-me, nem estás desculpada. Já não nos sabemos perdoar nem temos vontade.

Foi sem intenção, um momento apenas, mas peguei na caneta, olhei a folha em branco à minha frente, e disto tudo que fomos nós saiu-me apenas essa palavra, lamento, molhada de lágrimas que cobriram a folha, mais que a tinta, de um sentimento que chega ao fim...

Tão breve como um momento...

terça-feira, novembro 22, 2005

tão vulnerável um amor

Não sei escrever cartas. Mas encontrei-as. Amarelecidas pelo esquecimento, ressequidas de afectos, desdobrando-se em linhas pautadas, silenciosas. A melodia desaparecera, como desapareceram as palavras escondidas talvez em algum recanto da alma. Não lembro os destinatários. Apenas rostos descoloridos, sem memória.
E à beira das palavras, destas que recolho nos meus dedos, tento reconstruir o que deixei abandonado.

domingo, novembro 20, 2005

Ao mui galante senhor de Marrriálva

Meu Marialva donairoso,
como são belos vossos fins:
esse vosso falar amoroso,
os vossos galantes latins.

Escrevei, senhor, enfim
muitas cantigas de amores,
que essas me fazem a mim,
abanar-me com calores.

Tanto amor vosso me espanta!
(Carente era a vossa prima)
Eu sei que não é garganta,
É só uma questão de rima.

Não me queixo, vós sabeis
De uma qualquer maleita,
Que meu coração derreteis
E já tendes a cama feita.

Que isso a mim me faz gosto.
Continuai, senhor, a rimar,
O meu coração está posto
Para quem o sabe amar.

Mon Dieu! Mon Marrrrrialvá
Pois continuai-me a ortografar
Dessas belas cantigas, voilà!
Que cá me quedo p’rás olhar.

E aqui vos fico a aguardar
Se tanto há p’ra escrever!
Nunca me façais rabiscar
uma de escárnio e mal dizer.

Com uma vénia me vou
E este meu olhar de pejo,
E por aqui também vos dou
Um grandessíssimo beijo.

Resposta a "Escreve"

Minha bela senhora,

Eu, bela dona
se a soubera assim
tão carente de palavras minhas
já houvera escrito
cantar d’amor.

Senhora que sois tão formosa
lhe escrevo esta carta
jamais pra enganar
em tão grave dia
quisera eu só sonhar.

Senhora, vejo-vos queixar
mas eu vos amo tanto
que em meu coração
não cabe tamanha dor
de vos sentir assim mal de amor.


Colocada na caixa postal por: Marialva

sábado, novembro 19, 2005

Escreve...

Escreve-me, Amor, que eu não sei
Há quanto tempo já meu coração
Parou, gasto naquilo que te dei,
E nessas noites passadas em vão.

Escreve, Amor, uma palavra tua:
Saudade, ternura, carinho, enfim!
Volta a fazer-me sentir pura e nua,
Abraça-me em palavras só a mim.

E ,Amor, ainda que seja só a brisa
Quatro letras te peço, em carta lisa
Que me engana e que me faz sonhar.

Renova esse poema que era o nosso,
Esse que já esqueci, pois eu não posso
Perder-te no presente do verbo amar.

MariaMar (em versão espanca-me)
(aldra!)

--- ---- -----

Escreve-me, pá, que eu ando fartinha
De esperar aqui umas merdas tuas,
E sabes, já me dano eu todinha
Porque sei que tu andas é de luas.

Escreve, porra, que não tenho tempo
Para aturar gajos com desatenção
E que só escrevem se o “vento”
Lhes dá na real gana e é de feição.

Ou me escreves uma carta e agora
Ou de mim vais é levar o fora,
Que eu mando-te é apanhar letras

Nesse sitio que desde já te arda,
Porque carta que demasiado tarda
ou sai granda bosta ou são mesmo tretas!

MariaMar (em versão pimba)
(tásse bem!)

sexta-feira, novembro 18, 2005

Carta da insanidade do sonho...

Caro amigo,

Venho falar-te de um homem excepcional...
Pode encontrá-lo amiúde na zona da rua Augusta e da Praça da Figueira, onde tantas conversas tivemos nas esplanadas, e de onde te escrevo esta carta sem remetente.
Esse homem vive, sem vergonha, do que pede e dos recados que faz aos logistas dali, que confiam nele porque de facto é um homem fiável.

Sobre a sua condição diria que se vendeu à miséria a troco de sonhos e artes... Os favores que faz não os cobra ele, apontando, para tal, sempre a sua disponibilidade de tempo - o que não estou certo de que seja inteiramente verdade, pois que escreve, escreve continuamente, como se escrever fosse nele uma doença obsessivo-compulsiva a que não resiste -, contudo é raro o café aqui onde não encontre a bica paga, uma refeição, um pequeno lanche e até mesmo um maço de tabaco. São estes os rendimentos que fazem a sua minimalista contabilidade, apesar de ter enraizado em si um certo pudor em receber ofertas.
Não foi um homem de particular sorte ao que julgo, e sempre soube dar melhor do que soube receber. Ainda que muitas vezes tivesse dado de uma forma embaraçada e desajeitada e ninguem tivesse percebido o valor real. No entanto essas oferendas que agora aceita, luxos que o animam a manter a sanidade mental que aos olhos dos amigos - antigos, devo ressaltar - e familiares parece ter perdido.

É na verdade um homem lucido, ponderado no falar. O que continua a fazer pausadamente de uma forma lenta, um pouco desconcertantemente para a sua pouca idade, vinte e oito anos apenas, sem aparentar um unico dia a mais.
Perante o falar cuidado, o vocabulario variado percebe-se rapidamente que é um homem instruido. Suponho que seja por isso que acontece muitas vezes, durante um primeiro contacto, perguntarem-lhes porque leva aquela forma de vida e que passado teve. A sua resposta é lenta, reflectida, apesar de na verdade ter pensado nela apenas da primeira vez em que lhe colocaram a pergunta. Desde então repete o mesmo, mas como quem sente o mesmo, nunca como quem debita palavras, confessa que foi "algo de turvo que ficou para trás do que sou... E o que faço aqui...? bem... por aqui por aqui faço o que fui e sou - viajo e escrevinho poesia..." Há uma autoridade nas suas palavras que impossiblita o continuar do assunto.

Apesar disto ainda no outro dia alguem perspicaz ou meramente perdido na resposta perguntou-lhe "como assim? mas por onde viajas tu?!". Ele sorriu - tem os dentes amarelados pelo tabaco, apesar de manter intacta a sua higiende pessoal - entregou ao homem mais baixo de aspecto tenso e pesado, três ou quatro folhas manuscritas com poemas, desconcertando-o.
Enquanto o homem passava os olhos atrapalhado pelo q tinha em mão e sem lhe dar tempo para recompôr-se, murmurou levemente "por onde qualquer escrevinhador de poemas viaja: por dentro de mim... é um mundo fantastico... e... uma viagem que todos podem fazer...", piscou misteriosa e intimamente o olho ao homem num desafio silêncioso e sem mais desapareceu na multidão que, naquela hora de ponta, descia em direcção ao Terreiro do Paço. Ali onde o vinte e cinco de Abril também foi feito.
Ele gosta, por vezes de sentir o passado impresso nas paredes enquanto a brisa se ergue do rio e lhe acaricia o rosto...


Caro amigo, meu pai, conheces bem este episódio de que te falo agora, tão bem quanto eu...
Perdoa a falta de humildade com que refiro esse homem que sou como um ser excepcional... mas sei que se não o disser, senão o repetir exaustivamente tu nunca o farás, e talvez nunca o perceba...

Querias talvez nesse fim de tarde que eu recorda-se a tua posição de respeito, dono de uma construtora a mesma onde trabalhei, certamente demasiado bem pago por ser teu filho, porque um bom engenheiro civil eu nunca fui, nem sei ser...

Queria apenas, caro amigo, queridissimo pai que percebesses que tive de rasgar a mascara, ela que me pesava tanto enquanto eu beirava a loucura, no esforço de a manter sobre o meu rosto.
Despedi-me desse homem que fingi ser e recuperei-me, e junto comigo algo de indizivel, inominável... algo que nem eu sei o que é, mas que permaneceu inolvidável por baixos de todas as mascáras que usei. E resta ainda, intacto, neste homem de que te falo, que digo excepcional, que encontraste falhado um destes dias...
Mas eu quero apenas que percebas que falhado sim, mas também excepcional homem, que ainda te ama e considera o mais caro dos amigos, o mais querido dos pais...

15 de Novembro, de 2005

Carta a uma Amiga...

O Sol acordou brilhando no horizonte. Bateu nos vidros e qual invasor sem intenções, invade-me o aposento com os seus leves fios clareando o negro da escuridão. Os seus reflexos são intensos, dando uma cor difusa que se reflecte nas paredes.

Penso em ti, Amiga. E penso na falta que me fazem as tuas palavras serenas, doces, que muitas vezes me soltaram lágrimas silenciosas. Nelas, esquecia-me de mim, absorvendo a tua dor e esquecendo alguma minha.
O vento atrai tempestades, esse vento da noite, que derruba estrelas, vento que gela por vezes o meu corpo, vento de ira, vento que transforma um pequeno grão de areia, em pedra dura... vento que sempre volta, para lembrar a saudade e avivar a dor...vento que enlouquece a tempestade que se adivinha, nas ondas gigantescas deste mar que é a Vida.

O dia surgiu e tornou o silêncio negro da noite mais claro. O silêncio está sempre presente, ele envolve-nos com a sua melodia, mas é preciso saber escutá-la, tal como os nosso olhos descobrem o arco-íris...

O princípio e o fim do arco-íris é a brisa quente que me devolve a saudade de te "ouvir" aqui... numa canção doce e suave...

Onde quer que estejas, recebe o meu sorriso e o meu abraço

quinta-feira, novembro 17, 2005

devaneios...

Minha querida Vulcão

Sei que andas mortinha para que te escreva uma carta.

Minha amiga, não quero que te falte nada, o que eu faço para te ver feliz. Mas prepara-te, vai sair disparate! Mas tu que já me conheces sabes que a disparatar é que me sinto bem e que de tristezas já bastam as que bastam. Hoje não é dia para poesia, rimas e afins e quando leres esta logo pela manhã eu estarei a dormir. Ah pois é, amanhã é dia de gazeta, que se lixem as horas da ministra, o que eu quero é que ela viva feliz e que as meta no …Ups, agora acho que me excedi!

Vou mudar o registo desta carta. Ignora o primeiro parágrafo. Faz de conta que não o escrevi. Alguma coisa me diz que a primeira parte irá ser censurada.

Retomemos a dita.

Minha querida amiga, sei que andas feliz. Como ficar indiferente a estados de alma assim? Se pudesse abraçava todos aqueles que amo e desenhava-lhes sorrisos na cara…
Pronto, agora vai escorrer mel.
Ignora este também.
Vou recomeçar.

Oh gaja, pensas que é fácil, depois dum dia de trabalho escrever cartas?
Queres mimos? Olha vai ver a lua! De preferência acompanhada.
Já viste o que me fazes escrever? Lá se vai a minha reputação pelo cano abaixo.
Depois disto alguém me levará a sério? (se antes já era o que era…)

Olha, fica-te pelo abraço bem apertadinho…é sentido, tu sabes!



Maria Bethânia: Fera ferida (uma música que a Vulcão adora!)